quarta-feira, junho 28, 2006


acendo mais um. o cinzeiro está cheio e o maço quase vazio; assim copo o
copo.
será que ajuda a pensar, a ver melhor o mundo à minha volta, ou simplesmente me ajuda a abstrair dos meus pensamentos?
odeio estes momentos de reflexão. o que fiz, o que não fiz, o que deixei de fazer, onde estava certo e o que fiz de errado... também já nada interessa. tudo é passado, tudo é memória, mas já nada traz o tempo em que podia ter feito algo.
é, precisamente disso que me arrependo, do que não fiz mas devia ter feito.
o resto não interessa. fi-lo e assumo com orgulho, ou mesmo na falta dele, o que fiz pois essas acções são parte de mim, de quem eu sou. são esses actos que me fizeram e me tornarem em mim.
acendo outro, esta noite está mesmo agreste. não durmo a pensar no que não fiz. será que ainda vou a tempo?
provavelmente não, mas, no fundo do meu copo, apercebo-me: as minhas omissões são não mais que actos que apenas não aconteceram para os outros.
já não me arrependo pois também eles fazem parte de mim.
à quarta vez que encho o copo lá me vem à cabeça: "o futuro é que interessa", mas evito pensar dessa forma. recuso-me a planear o futuro; quero é vivê-lo para voltar a pegar neste copo que me reconforta este corpo cansado com o calor desse álcool que me queima e me destroi com a ajuda do cigarro. por falar nisso, lá vai mais um, mas não quero reflectir mais; quero que o dia chegue para que não me volte a arrepender do que não fiz; ou será que devo aproveitar e sair já agora? afinal de contas, "carpe diem" dizia o outro... não, não me sinto com pachorra. estes hábitos não me deixam sair de casa. ou eles, ou a brigada de trânsito, já não sei.
mas o copo já está de novo vazio e continuo a pensar nisto.
será que por ser assim, se devem aqueles actos e omissões, ou será que por esses actos e omissões me tornei assim?
certamente não fiz tudo sozinho, se errei, não terei sido o único, mas será que aqueles que erraram comigo também são responsáveis, ou serei eu responsável por eles?
o copo começa a dizer-me que é lixado viver nesta sociedade: "nunca sabemos de quem é a culpa, pois ela morre sempre solteira"... raio do copo, até diz umas coisas acertadas. pergunto-me se me diria o mesmo se estivesse cheio de água, mas desconfio que não.
desta forma, chego a conclusão nenhuma e isso conforta-me.
a caminho de mais um cigarro, aproveito a viagem para voltar a encher o copo de novo."mais um para a viagem", diz ele.
e de facto, não estava a peça de loiça enganada, mas vou-me embora fazendo um acordo com ele, com a sociedade personificadamente presente neste diálogo:
"tu assumes a tua parte das culpas que eu assumo a minha".

1 comentário:

ATG disse...

Quanto a cada um assumir a sua parte das culpas, já aprendi uma coisa: quando corrigi o que de errado havia em mim relativamente a uma pessoa, e os problemas continuaram, passei a assumir as culpas desta forma, quando me disseram que a culpa era dos dois, mesmo não fazendo eu já nada para colaborar com essa situação e a pessoa em causa insistir em coisas que não devia:
"realmente a culpa é dos dois. E a minha parte de culpa está em ter-te dado tantas oportunidades. Se não te tivesse dado mais do que 1 oportunidade, não tinhas feito tanta porcaria. Tens razão. A culpa é minha".
Por vezes a nossa responsabilidade nas culpas passa por isto: dar-se oportunidade a quem não merece, ou não sabe aproveitar.